Autor(es):
Ano:
Artigo em foco: É o Estado Capaz de se Autorreformar?
Um Estado com alta carga tributária, mas com poucos servidores públicos, altamente qualificados. É esse o modelo de governo defendido pelo economista Luiz Carlos Bresser-Pereira. professor titular da FGV-EAESP. No ensaio “É o Estado capaz de se autorreformar?”, publicado na revista acadêmica Desigualdade & Diversidade, Bresser-Pereira argumenta que, para o Estado ser eficiente, esse pequeno grupo de funcionários públicos deve ser responsável por arrecadar grande quantidade de dinheiro e delegar a gestão dos serviços básicos e gratuitos, como saúde e educação, para organizações sociais não estatais – na sua visão, capazes de aplicar os recursos dos impostos a custos mais baixos.
Bresser-Pereira afirma que diversos países já vem fazendo o que ele chama de “reforma gerencial”, a começar pela Inglaterra, em 1987. No Brasil, esse processo iniciou-se em 1985, com o Plano Diretor de Reforma do Estado. “Mais cedo ou mais tarde, todos terão que fazê-la”, afirma. “No Brasil, começamos a reforma cedo, e ela está caminhando bem, porque ganhou o coração e as mentes dos administradores públicos”.
O autor pondera que, no capitalismo, os países competem de modo que, se não forem eficientes na gestão governamental, não crescerão e perderão a disputa. Ocorre que, ao longo da história do sistema capitalista, o Estado aumentou muito de tamanho. Se na época do Absolutismo o Estado representava cerca de 7% do PIB na Europa Ocidental, hoje responde por aproximadamente 42%do PIB. Ou seja, é seis vezes maior. Em alguns países, até mais. Na França, por exemplo, essa participação chega a 50% do PIB.
Quando a proporção da arrecadação e das despesas públicas na economia era pequena, a taxa de crescimento dos países não dependia quase nada da eficiência do setor público, e sim da competitividade das empresas privadas. Hoje, calcula o economista, supondo que a expectativa de crescimento da França seja de 2%, se a produtividade da gestão pública não aumentar, o setor privado terá que crescer 4% para compensar. “Por isso, o problema que cada país tem é saber se começa a reforma de seu Estado antes ou depois, se faz mais depressa ou mais devagar, se faz mais bem feita ou não”, indica Bresser-Pereira.
O economista acredita que o Estado deve ser grande, pois, quando representava parcela pequena do PIB, seu objetivo era defender a oligarquia dominante, com o dinheiro que arrecadava da população como um todo. No século XIX (no Brasil, em 1937, durante o governo Getulio Vargas), começou a ganhar espaço o que Bresser-Pereira chama de “Estado social”, que passou a ter como missão aumentar a qualidade de vida da população e diminuir as desigualdades inerentes ao sistema capitalista. “O capitalismo é um sistema econômico bastante eficiente, mas é cego à justiça e à estabilidade, tende a concentrar a renda na mão dos mais poderosos, dos mais espertos, dos mais ladrões, dos mais inteligentes, aqueles que forem ‘mais’ alguma coisa”, afirma.
Com um sistema de serviços públicos gratuitos de educação, de saúde, de assistência social, imaginava-se que a qualidade de vida poderia ser substancialmente melhorada, a um custo relativamente barato. Isso se comprova na prática, argumenta Bresser-Pereira, por exemplo, quando se toma o caso dos serviços de saúde que existem hoje no mundo desenvolvido. A Europa adotou um sistema de saúde público universal, com custo aproximado é de 9% do PIB. Já nos Estados Unidos, que optou por um serviço privado, esse percentual é de 16%, e ainda é preciso considerar o fato de que 40 milhões de americanos ainda não têm atenção à saúde assegurada. “Mesmo sem reforma gerencial, o consumo coletivo é mais eficiente do que o consumo privado”, argumenta Bresser-Pereira.
Para ele, a ideia da reforma gerencial, foi mal compreendida, tanto pela direita quanto pela esquerda, pois ambas entenderam que seu objetivo era reduzir o Estado ao mínimo. “Não era isso, a reforma visa legitimar o Estado social, um Estado grande com uma carga tributária elevada e que privilegia fundamentalmente os pobres”, afirma.
De acordo com o modelo gerencial, o aparelho do Estado deve ser formado por um grupo de políticos eleitos e por um grupo de servidores públicos bem remunerados. “Eu não admitiria ninguém que não tivesse curso de graduação, recrutado dentro da elite da inteligência existente no país”, afirma. As organizações sociais, por sua passam a prestar os serviços universais com financiamento público e devem ser fortemente controladas pelo Estado por meio de contratos de gestão e de mecanismos para mensurar os resultados de sua gestão.
Quando Bresser-Pereira fez parte do governo, em 1995, verificou que os servidores públicos de nível inferior ganhavam três vezes mais do que profissionais com cargos similares no mercado privado, enquanto a alta administração pública recebia comparativamente cerca de 40% menos. “Lutei pelo aumento dos salários públicos de nível elevado e consegui alguma coisa, mas, enfim, sempre vai haver muito debate. As organizações sociais, por exemplo, ainda vão provocar muita discussão, mas não tenho dúvida que na saúde, na educação, são uma forma administrativa muito mais eficiente e devem ser adotadas”.
Entre em contato com o professor Luiz Carlos Bresser-Pereira.
Conheça as pesquisas realizadas pelo professor Luiz Carlos Bresser-Pereira.