Gestão da Saúde: Desafios e Respostas

Autor(es): 

Ana Maria Malik e Marcelo Caldeira Pedroso

Ano: 

2011

Artigo em foco: As Quatro Dimensões Competitivas da Saúde
 
Os países enfrentam cada vez mais desafios para conseguir fornecer a seus cidadãos condições de saúde adequadas, a custos controlados. A razão é, principalmente, o prolongamento da expectativa de vida da população mundial. No Brasil, por exemplo, essa expectativa aumentou mais de dez anos entre 1980 e 2009 – para 73,2 anos, segundo o IBGE. Estimativas desse mesmo instituto indicam que o número de pessoas com mais de 60 anos deve dobrar nos próximos 20 anos, até atingir aproximadamente 30% da população total, em 2.050. As necessidades de cuidados, investimentos e gastos com saúde tendem a aumentar não só pela alteração da pirâmide populacional como também em função de outros três fatores: aumento do acesso aos serviços, crescente conscientização dos indivíduos de que devem cuidar da saúde e maior disponibilidade de recursos tecnológicos.
 
Os pesquisadores Ana Maria Malik, professora da FGV-EAESP, e Marcelo Caldeira Pedroso, da FEA-USP, estudaram alguns modelos que procuram responder a esta mudança de cenário. Para eles, o foco central de um sistema ideal de saúde é organizá-lo de acordo com o nível de complexidade da necessidade e da demanda. Estima-se que entre 80% e 90% dos problemas de saúde são recorrentes.
 
Como os procedimentos para tratar tais problemas já foram muito estudados, devido a sua alta prevalência, a prestação de serviços pode ser padronizada por meio de protocolos clínicos ou de diretrizes assistenciais. As “clínicas de varejo”, presentes nos Estados Unidos, constituem um modelo para procedimentos simples para oferta de serviços sequenciais de baixo custo com conveniência em termos de acesso para o usuário.
 
Níveis intermediários de complexidade ficariam em serviços especializados. E, por fim, os procedimentos que requerem tecnologia e conhecimentos mais sofisticados, seriam realizados em hospitais de alta especialização. “Há ganhos de eficiência e de qualidade nesse último caso, pois esses centros de referência conseguem economias de escala com seus altos volumes de atendimento e, por serem especializados, avançam rapidamente na curva de aprendizado das operações”, afirmam Malik e Pedroso.
 
O Shouldice, do Canadá, é reconhecido mundialmente como um hospital modelo para tratamento de hérnias, e obtém um custo médio por procedimento inferior ao de um hospital geral. Na Índia, o Aravind Eye Care Hospital é uma organização focada em tratamento oftalmológico e apresenta altos volumes e baixos custos. O também indiano Narayana Hrudayalaya realiza cirurgias cardíacas tradicionais com preços correspondentes a uma fração daqueles praticados em hospitais estadunidenses . No Brasil, o Hospital do Rim e Hipertensão, localizado em São Paulo, é uma referência internacional em tratamento renal, tendo sido considerado, até 2011, o maior transplantador de rins do mundo.
 
Para procedimentos complexos que exigem tecnologias ainda em desenvolvimento, Malik e Pedroso encontraram na literatura a indicação de que os serviços devem ser personalizados. Um exemplo é o modelo de “centro integrado”, em que uma mesma infraestrutura provê acesso a um conjunto de recursos humanos, recursos materiais e tecnologias complementares. Esses centros são utilizados, por exemplo, para pesquisa e tratamento de especialidades em constante desenvolvimento, como neurologia e oncologia.
 
Outro aspecto que Malik e Pedroso analisaram é a previsibilidade nos serviços de saúde. Há problemas previsíveis, que demandam assistência regular e preventiva. Outros, de alta complexidade, como transplantes e necessidade de internações longas em UTI, são, por sua vez, menos previsíveis. Quando ocorrem, podem levar a custos inesperados e dificilmente controláveis. Uma terceira parcela da necessidade vem de doenças crônicas. Uma vez diagnosticadas, elas apresentam relativa previsibilidade no consumo de produtos e de serviços de saúde.
 
Com base nessa segmentação, alguns países adotam a “conta poupança saúde”. Trata-se de um mecanismo similar ao do tíquete-refeição: um valor é depositado na conta, a ser utilizado apenas para gastos de saúde pelo titular. Para Malik e Pedroso, esse modelo apresenta duas vantagens. Primeiro, como é o usuário quem escolhe diretamente o prestador de serviço, aumenta a competição no mercado. Segundo, o beneficiário pode acumular recursos para serem utilizados posteriormente, por exemplo, quando se aposentar. ”No Brasil, a implantação de uma conta no formato VGBL saúde poderia ser utilizada para assistência básica e permanente, enquanto a assistência crítica para serviços de baixa previsibilidade seria mais bem coberta por meio de um seguro-saúde”, afirmam os pesquisadores.
 
Malik e Pedroso chamam a atenção para a deficiência do modelo de financiamento brasileiro. Aqui, a maior parte dos recursos de saúde é utilizada por uma pequena parcela da população, o que contraria um dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), o da equidade. “Além disso, ineficiências são geradas no país pela pouca integração entre os sistema público e privado, um aspecto que necessita ser mais discutido”, sugerem os pesquisadores.
 
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