Os Interesses por Trás das Políticas Públicas

Autor(es): 

Francisco Cesar P. da Fonseca

Ano: 

2013

Artigo em foco: Dimensões Críticas das Políticas Públicas
 
As políticas e os programas governamentais, genericamente intitulados políticas públicas, são tidos como naturais, neutros e consensuais pelo cidadão. De acordo com Francisco Fonseca, professor da FGV-EAESP, essa imagem “generosa” das políticas públicas, em que todos ganham e ninguém perde ou discorda, “é não apenas falsa como representa verdadeira armadilha à compreensão de seu significado, na medida em que encobre disputas de poder”.
 
No artigo “Dimensões críticas das políticas públicas”, publicado nos Cadernos EBAPE.BR, Fonseca defende que se vejam as políticas públicas como a expressão de uma ampla teia de interesses, permeada por conflitos. De fato, os conflitos ficam claros nas decisões orçamentárias relacionadas a uma determinada política, no número e qualificação de servidores envolvidos em sua consecução e no aparato institucional mobilizado.
 
O autor do artigo cita como exemplos duas questões centrais referentes à ocupação do espaço metropolitano: os meios de transporte e o mercado imobiliário. No caso da mobilidade urbana, diz Fonseca, corredores de ônibus e ampliação da frota de transporte público tendem a ser aceitos se a estrutura de incentivos à indústria automobilística e o livre trânsito de automóveis permanecerem intocados. No caso do setor imobiliário, historicamente parte dos vereadores é financiada por essa indústria, e as leis de zoneamento tendem a ser lenientes com os grandes interesses. “Muitos dos males de nossas cidades provêm dessa estrutura de poder pouco confrontada política e institucionalmente, apesar da existência de ‘políticas públicas’”, afirma o professor da FGV-EAESP.
 
Para Fonseca, os governos reformadores somente serão progressistas se, mesmo no âmbito municipal, houver protagonismo capaz de conhecer e enfrentar os interesses estabelecidos, que atualmente são capazes de vetar mudanças sociais mais profundas.
 
“Mas, então, como explicar os inequívocos avanços sociais vigentes há pouco mais de uma década no Brasil?”, questiona-se o pesquisador. O preço para isso foi a rendição do PT às regras estabelecidas (financiamento privado de campanhas, coalizões amplas e contraditórias, e negociação do programa de governo), assim como o compromisso de que as políticas públicas não seriam radicais.
 
Segundo o autor, isso permitiu fazer reformas pelas bordas, sem assustar as elites. É o caso da ampliação do crédito, do aumento do poder de compra real do salário mínimo, dos programas de transferência de renda e da ativação da economia interna. “É vedado, no entanto, incidir nas grandes fortunas, nos lucros e no ambiente de negócios”, afirma o pesquisador.
 
Para Fonseca, o resultado é que os avanços acabam ficando aquém do que poderiam ser ou convivem com outras “políticas públicas” claramente conservadoras – por exemplo, o apoio desmesurado ao agronegócio e o não enfrentamento do oligopólio da grande mídia. Assim, o Brasil continua a ostentar índices alarmantes de desigualdade.
 
Para que as “políticas públicas” sejam mais inclusivas, expressivas e “radicais” –“no sentido de irem à raiz dos problemas com vistas a transformá-los” –, torna-se fundamental, de acordo com o autor, enfrentar os interesses constituídos que sustentam o sistema político brasileiro e travam mudanças profundas.
 
Fonseca defende a chamada “radicalização da democracia”, com diversas ações, como: a ampliação crescente dos espaços de participação e deliberação nas arenas decisórias, institucionais e sociais; a tradução das linguagens oficiais herméticas, a começar pelo orçamento; o aprofundamento da transparência decisória; e a revisão do oligopólio da mídia.
 
Somente com o apoio dos movimentos sociais, por meio de canais institucionais de participação política, e com a ampliação da transparência, será possível, segundo o professor da FGV-EAESP, mudar as regras do jogo: o “jogo político”, em que hoje predomina a privatização da vida pública, e o cerne fiscal-tributário-orçamentário. “Dessa forma, pode-se dizer que é possível ‘fazer mais’ do ponto de vista fiscal, tributário e orçamentário – sem o que as ‘políticas públicas’ como um todo e as sociais em particular tornam-se meros apêndices –, o que implica fundamentalmente enfrentar os grandes poderes constituídos”, diz ele.
 
Fonseca conclui que “somente ‘políticas públicas’ consistentes, sistêmicas e transformadoras serão capazes de reverter, mesmo que no médio prazo, a abismal desigualdade socioeconômica e política, entre outras, que ainda vigem na sociedade brasileira”.
 
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