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Artigo em Foco: Democracia e Eficiência: A Difícil Relação Entre Política e Economia no Debate Contemporâneo
O senso comum vê a política como espaço de irracionalidade, a ação estatal como ineficiente e as práticas democráticas como obstáculo à eficácia das políticas econômicas. Em ensaio publicado na Revista de Economia Política, os professores do Departamento de Gestão Pública da FGV-EAESP Maria Rita Loureiro e Fernando Luiz Abrucio mostram como essa concepção é marcada por uma visão limitada e economicista do mundo.
O problema, afirmam os autores, é que eficácia e racionalidade são conceitos restritos para entender e lidar com a política. A economia passou a ter, a partir da escola neoclássica, uma pretensão cientificista de descobrir “leis naturais” e “princípios gerais”, ou seja, universalmente válidos e inquestionáveis. Porém, atrás de uma “verdade” matemática, há pressupostos sobre como os cidadãos pensam e sobre como a sociedade funciona: as pessoas agiriam de modo egoísta para maximizar seus interesses e a conjugação dos desejos e ações levaria “naturalmente” a um estado de equilíbrio – isso se influências externas não interferissem.
Transferindo esses conceitos de mercado para a esfera da política, a Teoria da Escolha Pública definiu, em termos extremamente simplistas e empobrecidos, o político como um vendedor de programas políticos e os eleitores como compradores desses programas. Por sua vez, os burocratas também seriam atores racionais que buscam maximizar seu autointeresse, ou seja, ampliar seu espaço de poder e os recursos à disposição no aparato governamental. Assim, o Estado teria uma tendência crescente à expansão e seus atores principais tenderiam a aproveitar as brechas possíveis para se apropriar dos recursos disponíveis.
Mas o que garante que os indivíduos só pensem neles próprios? Loureiro e Abrucio citam Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia em 1998: “O egoísmo universal como uma realidade pode muito bem ser falso, mas o egoísmo universal como um requisito da racionalidade é patentemente um absurdo”. A ideia de um mercado que produz equilíbrio vem sendo ainda mais questionada. Para os autores do ensaio, essa noção, que pressupõe a neutralidade perante valores e que nega o conflito social, acaba por rejeitar a política.
Para os que seguem a visão economicista, que parte dos conceitos acima apresentados com nuances de diversa ordem, a governabilidade e a efetiva capacidade decisória do Estado só podem ser garantidas se as decisões econômicas não sofrerem qualquer interferência política ou se existirem arranjos institucionais que concentrem o poder. Em outras palavras, haveria a necessidade de redução das arenas em que as divergências, os conflitos e eventuais consensos poderiam surgir. As decisões governamentais deveriam, quando muito, ser entregues aos técnicos ou ao mercado.
Loureiro e Abrucio defendem visão inversa, que não separa a política da economia. Para eles, não se deve adotar um olhar estilizado sobre o comportamento humano, enxergando apenas um aspecto, o da maximização do autointeresse. “Orientações éticas e arranjos institucionais pelos quais os interesses mais amplos da sociedade são filtrados mostram-se decisivos para o próprio desempenho econômico”, afirmam, com base em discussões teóricas e pesquisas empíricas. Citam, ainda, estudos recentes que descrevem implementação bem-sucedida das políticas públicas por meio de processos que envolvem amplas negociações e debates com uma pluralidade de atores políticos. Isso porque, tendo que negociar e prestar contas, os formuladores de políticas aumentaram a compreensão dos problemas, ampliaram a capacidade de obter informações críticas e puderam, assim, corrigir erros de cálculo que, provavelmente, só apareceriam no momento da implementação das políticas. Em suma, os autores ressaltam que já começa a ser quebrado o pressuposto, dominante no mainstream econômico e na ciência política, de que a concentração de poder (que é uma forma de redução da esfera política) seja condição necessária para a efetividade dos governos ou a governabilidade.
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