O Comportamento Especulativo dos Gestores Financeiros

Autor(es): 

João Luiz Guillaumon Lopes, Rafael Felipe Schiozer e Hsia Hua Sheng

Ano: 

2013

Artigo em foco: Hedge e Especulação com Derivativos Cambiais: Evidências de Operações Cotidianas
 
Em tese, empresas utilizam derivativos para se proteger de riscos, principalmente de variação cambial que possa prejudicar suas operações de comércio internacional. No entanto, são conhecidos casos de grandes perdas financeiras que envolveram o uso de derivativos. No Brasil, esse tema ganhou atenção no final de 2008, quando o real sofreu extrema depreciação, e empresas tradicionais, como Sadia, Aracruz e Votorantim Celulose e Papel, anunciaram perdas recordes com as operações de derivativos com suposto propósito de hedge (proteção).
 
As estimativas sobre as perdas das empresas brasileiras com derivativos cambiais na época variam entre 10 bilhões de dólares (Banco Central) e 25 bilhões de dólares (Bank for International Settlements – BIS). No final de 2008, após a divulgação desses prejuízos, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiu a Deliberação 550, que obriga as empresas de capital aberto a divulgar trimestralmente a política de hedge adotada, o nível de exposição e de sensibilidade aos fatores de risco, e os ganhos ou perdas com derivativos.
 
No estudo “Hedge e especulação com derivativos cambiais: evidências de operações cotidianas”, publicado na RAC-Revista de Administração Contemporânea, João Luis Guillaumon Lopes, Rafael Felipe Schiozer e Hsia Hua Sheng, da FGV-EAESP, investigam o uso de derivativos de moedas por parte de empresas não financeiras brasileiras.
 
Os resultados desse estudo quantitativo, que tomou como base 29 mil operações de derivativos cambiais entre os anos de 2003 e 2011, mostram que, no período de 2003 a 2008, houve um forte componente especulativo nas decisões quotidianas dos gestores financeiros. Já no período de 2009 a 2011, não foi identificado tal comportamento. “Os resultados reforçam a evidência de que as grandes perdas com derivativos cambiais em 2008 tenham funcionado como um alerta para gestores, conselheiros, investidores e reguladores, que passaram a monitorar mais atentamente as operações com derivativos”, afirmam os pesquisadores.
 
Os indícios de comportamento especulativo, segundo Lopes, Schiozer e Sheng, vêm do fato de os gestores financeiros desmontarem as posições de hedge para obter lucro, deixando as empresas expostas ao risco operacional do negócio, ou seja, os gestores se aproveitariam da exposição natural das empresas (82% das companhias da amostra têm histórico de importação e exportação) para fazer trading, decidindo quando manter a exposição “hedgeada” ou não. “Tal resultado é relevante quando pensamos nas implicações que isso representa em termos de governança corporativa, ou seja, para a identificação, seja pelos acionistas, pelo conselho, ou pela alta administração da empresa, da real exposição ao risco assumida pela companhia”, argumentam os autores do estudo.
 
Ao avaliar o perfil das empresas que apresentam indícios de especulação, a pesquisa revela que as de capital nacional e aberto têm menor propensão ao comportamento especulativo, “o que é coerente com a maior divulgação de informações e melhores práticas de governança que as companhias listadas em bolsa precisam adotar”, afirmam Lopes, Schiozer e Sheng.
 
Por outro lado, são multinacionais de capital negociado em bolsa que se destacam entre as empresas com maior propensão ao comportamento especulativo. O que explicaria esse resultado? Segundo os autores da pesquisa, os gestores dessas empresas tendem a acreditar que têm maior vantagem informacional e expertise quanto ao mercado de câmbio e, além disso, estão mais distantes dos controladores.
 
Lopes, Schiozer e Sheng concluem que há uma linha tênue e perigosa entre as operações de hedge e as especulativas, “não sendo possível distinguir claramente as operações destinadas a reduzir o risco financeiro da empresa daquelas que objetivam um retorno positivo per se”. A partir do momento em que as empresas são levadas a utilizar derivativos para seu gerenciamento de risco, a mudança para uma atitude de tomar posições buscando resultados financeiros positivos parece ser comum. “Aparentemente, ao decidir pelo hedge, a empresa pode estar, na verdade, utilizando uma exposição existente para justificar a tomada de uma posição especulativa”, afirmam os pesquisadores.
 
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