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Pesquisa em foco: Viver e morrer pelo trabalho: uma análise da banalidade do mal nos crimes corporativos
Acidentes, suicídios e outros acontecimentos fatais nas organizações resultam de ações rotineiras tomadas por chefes e colegas no “mais alto senso” de cumprimento dos seus deveres.
Objetivo: Analisar os crimes organizacionais a partir do conceito de banalidade do mal da socióloga judia Hannah Arendt, que, ao presenciar o julgamento do nazista Adolf Eichmann, avaliou que ele não era um psicopata, mas sim uma pessoa comum, um burocrata cumpridor de ordens e que queria ascender na carreira.
Raio X da pesquisa
• Definição de crimes corporativos como mortes relacionadas ao trabalho (são mais de dois milhões de casos por ano no mundo, segundo a OIT), uma questão controversa – a quem cabe a responsabilidade se as mortes acontecem no cumprimento de ordens advindas de um sistema?
• Análise de reportagens jornalísticas sobre dois casos: o primeiro, de um auxiliar de limpeza da multinacional Dalkia encontrado morto em uma prensa compactadora de papelão dentro de uma área de carga do shopping West Plaza, em São Paulo; e o segundo, dos suicídios de profissionais da Renault da França.
Resultados
• No primeiro caso, do auxiliar de limpeza, as notícias indicam que o funcionário foi vítima de uma “gambiarra”, uma adaptação irregular do equipamento por funcionários para que a prensa funcionasse mais rapidamente sem o uso de uma porta de segurança. No segundo caso, dos suicídios da Renault, as reportagens mostram que havia uma pressão extrema para o cumprimento de metas – uma das vítimas deixou uma carta confessando que se sentia incapaz de assumir seu trabalho: “é muito duro suportar o ritmo da empresa”, escreveu.
• Nos dois casos, é possível fazer um paralelo com o conceito de banalidade do mal de Arendt, pois as mortes foram consideradas comuns, resultado de decisões tomadas para alcançar objetivos normativos, procedimentos operacionais, padrões e normas culturais das organizações. Profissionais sem aparente senso de perversidade, e sim com alto senso de cumprimento de seus deveres, que provocaram os crimes. A conduta dos indivíduos foi incentivada pela estrutura de regras e planos que os tornaram incapazes de criticar e prever as consequências dos seus atos, e traduziu-se na banalidade do mal.
O que há de novo
• As ações que se destinam a atingir os objetivos empresariais, e que acarretam a morte de trabalhadores, tornam a noção de crime corporativo banal? O artigo mostra que sim, pois viver e morrer pelo trabalho soa como se isso fosse algo comum.
• O estudo reforça a existência do lado sombrio nas organizações, e que este anda junto com o “lado que brilha”, o que pode levar ao reconhecimento dos gestores sobre a necessidade de práticas transformadoras, no sentido de impedir que a banalidade do mal desafie o pensamento e as palavras do trabalhador e, principalmente, os seus próprios pensamentos.
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